sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Maracanã: “ex-paço” público, espaço de exclusão

Do fim da geral à gradativa exclusão do negro dos estádios

Por Ricardo Riso

Até meados dos anos 1990 havia a famosa geral do Maracanã, o espaço mais barato e democrático do gigantesco (naquela época) estádio. Por conseguinte, o torcedor era obrigado a ficar em pé sob sol ou chuva e a permanecer no local de pior visibilidade, em que não conseguia ver a linha lateral do lado oposto ao seu. Esses exemplos demonstram o “respeito” que havia por parte dos administradores do estádio e dirigentes dos clubes com a parcela do público, de maioria negra e mestiça, que frequentava essa área.

Com o passar dos anos, as eternas reformas continuaram a sugar o dinheiro público em obras superfaturadas enquanto o gigante encolhia. Até que se decidiu adequar o estádio às exigências da Fifa, ou seja, somente lugares com assentos. Em nome dessa suposta modernidade, enfatizando o conforto, a ampliação do estacionamento, dos serviços, as áreas vips (sem negros), o preço dos ingressos que sofreu aumentos consideráveis nos últimos anos etc. o público do Maracanã clareou.

Tudo isso mascarou o desejo de excluir a população menos favorecida dos jogos, obrigando a população de origem negra a optar em ir a pouquíssimas partidas para não estourar o orçamento familiar, ou a não ir, simplesmente. O agravante dessa situação é que hoje temos uma juventude negra impossibilitada de acompanhar os jogos do seu time no estádio que se confunde com a alma do carioca.

Se João Saldanha fosse vivo, certamente seria uma voz contrária à opção elitista de público. João provavelmente abordaria a injustiça em excluir os negros dos estádios, pois se o futebol virou paixão nacional foi com a contribuição dessa parcela da população que, inclusive, forneceu os melhores jogadores que o país já viu.

Ah! Argumentam que as tv’s a cabo e os seus pacotes de pay-per-view mais os jogos nos canais abertos suprem essa carência. Pergunto: quem pode pagar o valor de uma assinatura de tv a cabo e, ainda, os pacotes dos jogos? E são raras as partidas que passam nos canais abertos. Ou seja, permanece inalterada a agonia do torcedor negro.

O que aconteceu no Maracanã é um exemplo do que vem ocorrendo nos outros estádios brasileiros. Preocupo-me com a elitização desenfreada do espetáculo esportivo mais popular do país e de como será quando começar a Copa do Mundo de 2014. Os preços serão exorbitantes, provavelmente. Logo, veremos os estádios onde o Brasil jogará com uma plateia sem negros e revelaremos ao mundo a nossa tão propalada democracia racial. E nossos estádios ficarão parecidos com o que acompanhamos nos ginásios de basquete da NBA: nas quadras, jogadores negros em sua maioria; nas arquibancadas, quando há negros, ou são ex-jogadores ou artistas consagrados.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

À procura da bola limpa


Bola limpa é aquela bola que o atacante com sua habilidade, astúcia e técnica ganha do seu adversário e a entrega em condições ideais de passe ou finalização ao seu companheiro, ou bola limpa é aquela bola que o zagueiro retira, de forma legal, do seu oponente e a recupera para o seu time, limpando a área e o perigo de gol.


A recente conquista do campeonato brasileiro pelo Flamengo, tendo Andrade como o primeiro técnico negro a ganhar este título, me fez recordar vários momentos em que o negro é inferiorizado e discriminado no futebol, o que poderia ser uma metonímia da sociedade brasileira. A soma dessas lembranças motivou a criação deste blog.


Sendo assim, proponho a discussão das relações étnico-raciais no futebol brasileiro, englobando as situações entre os jogadores, técnicos, dirigentes, torcidas e mídia, ou seja, questões pertinentes que raríssimas vezes são debatidas. Temas que são verdadeiras bolas divididas. Todavia, ao mencioná-las, espero contribuir para a reflexão acerca do racismo em nossa sociedade e quebrar os estereótipos impostos pela perversidade da linguagem estabelecida e sobre a figura do jogador negro, incluído no mundo do futebol como o artista da bola, porém excluído das posições de liderança e de “saber” que cercam este mundo.


E quem sabe um dia a diversidade étnico-racial brasileira seja respeitada não só no futebol, mas em toda a sociedade, e tenha a generosidade de um jogador que passa uma bola limpa ao seu companheiro.


Ricardo Riso