quarta-feira, 16 de junho de 2010

Um outro 16 de junho que não deve ser esquecido

por Ricardo Riso

16 de junho de 2010, Copa do Mundo de Futebol sendo realizada na África do Sul. Em meio ao evento, torna-se imperioso recordar o que aconteceu há exatos 34 anos. Naquela época, o país vivia sob o tenebroso e injustificável regime do apartheid promovido pela minoria branca conhecida como afrikander.

No dia 16 de junho de 1976 um grupo de estudantes negros organizou uma passeata em Soweto para protestar contra a imposição do ensino do idioma dos brancos, o afrikanns, junto à língua inglesa nas escolas somente frequentadas pelos negros. Como resultado, a repressão violenta e estúpida por parte das autoridades regidas pelo apartheid aos estudantes, que combatiam o mais cruel meio assimilacionista: a imposição da língua.

No fim, em torno de 500 pessoas foram assassinadas, sendo que, dentre os mortos, o jovem de 13 anos, Hector Pieterson acabou entrando para a História por causa de uma foto que o mostra agonizando nos braços de outra pessoa. Essa imagem correu o mundo e provocou a revolta dos negros sul-africanos em diversos pontos do país.

Isso só para relembrar o quanto foi difícil e tortuoso o caminho até o fim do apartheid em 1990. Se hoje ocorre o maior evento do mundo na África do Sul, não devemos esquecer o que a população negra deste país sofreu até chegar a este 16 de junho.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Gyan, o autor do gol de Gana contra a Sérvia


Toda a África está conosco. Eu saúdo todos vocês. Nós vencemos esse jogo para vocês,
bradou Gyan, o autor do gol de Gana contra a Sérvia, hoje. 
(Fonte: Blog da Cidinha)

Lindo gesto, linda frase... extrema sabedoria pan-africana! Por enquanto, o momento mais bonito da Copa!
Ricardo Riso

O Brasil que se quer branco não elogia as mulheres negras presentes na Copa

Por Ricardo Riso

É impressionante como o racismo se apresenta nas transmissões brasileiras durante os jogos da Copa do Mundo e nos demais canais de comunicação. Há pouco, deparei-me com esta matéria no site do G1: “Gatas na partida entre Holanda e Dinamarca - Lindas torcedoras marcam presença no duelo europeu”. Trata-se de uma série de fotos tiradas das mulheres nas arquibancadas. Todas brancas, louras, lábios finos e cabelos lisos. Por outro lado, o site UOL mostra-se sensível: de trinta e nove fotos das “Musas da Copa” encontramos duas negras, ou seja, 5,13%.

A transmissão da Copa sempre destaca as mulheres nas arquibancadas. As negras estão em grande número, principalmente nos jogos das seleções africanas. Todas lindas e belas com seus cabelos trançados, magnânimos sorrisos e danças inebriantes, porém nenhum narrador destaca a beleza dessas mulheres, quando falam sobre elas, veem os estereótipos da festa constante, da alegria sem fim... Jamais, eu disse, jamais fala-se que elas são bonitas, que elas são meigas, que elas são carinhosas... Afinal, na sociedade brasileira foi vilipendiado o afeto à mulher negra, por isso a dificuldade dos narradores de transpor as qualidades que são ditas às brancas, às negras, pois às negras resta o desprezo, o nojo, quando muito o desejo sexual violento, ausente de amor.

Essa é a triste realidade de um país com maioria negra e mestiça, mas que se quer branco. Entretanto, como sou insistente, regozijo-me sempre quando os sorrisos dessas lindas mulheres negras aparecem na televisão, contrastando com alguns tenebrosos jogos desta Copa do Mundo.

Bom, enquanto aguardo que o site G1 faça um álbum com as mulheres negras da Copa, brado, em alto e bom som:

Viva às mulheres negras da Costa do Marfim!

Viva às mulheres negras de Gana!

Viva às mulheres negras de Camarões!

Viva às mulheres negras da África do Sul!

Viva, sobretudo, às mulheres negras brasileiras!!!

Época de Copa do Mundo, Barbosa merece ser lembrado

Por Ricardo Riso

A maior pena que existe para um crime no Brasil é de trinta anos. Mas desde 1950 eu sou condenado.
(Barbosa frase extraída do livro “A pátria em chuteiras – novas crônicas de futebol” de Nelson Rodrigues)

Aproxima-se uma nova estreia do Brasil em Copa do Mundo e urge recordar o jogador que sofreu a maior perseguição já afligida por um cidadão brasileiro, falamos do goleiro da Copa do Mundo de 1950, o negro Moacir Barbosa Nascimento. Pode-se perceber pela epígrafe que a declaração de Barbosa assinala a pena de vida à qual foi obrigado a viver até o dia 8 de abril de 2000, data de seu falecimento.

O drama do vitorioso goleiro Barbosa, nascido a 27 de março de 1921 na cidade de Campinas/SP, se deu após o chute fulminante do atacante uruguaio Ghiggia à meta canarinha, o fatídico gol que decretou a derrota brasileira, consagrando a seleção celeste bi-campeã na partida que entrou para a História como Maracanazzo. A tragédia maior do país, presenciada por duzentas mil pessoas, reforçou diversas máximas racistas ao jogador negro, a maior delas, talvez, a de que negro não serve para goleiro.

Esse fato motivou as artimanhas peculiares do racismo brasileiro e as suas formas perversas de exclusão. Conceito que somente foi revisto após a carreira brilhante do goleiro Dida, consagrado no Corinthians e no Milan italiano, tornando-se goleiro titular do Brasil na Copa de 2006, 56 anos depois de Barbosa. Repito: 56 anos se passaram para que um excepcional goleiro negro pudesse voltar ao gol da seleção e rompesse a barreira do preconceito.

Em razão do distanciamento temporal e das raras imagens da partida - eu, por exemplo, até hoje só vi o lance do gol, mesmo assim já com Ghiggia próximo ao gol brasileiro -, válida é a frase de Nelson Rodrigues nove anos após a funesta derrota nacional: “Quando se fala em 50, ninguém pensa num colapso geral, numa pane coletiva. Não. O sujeito pensa em Barbosa, o sujeito descarrega em Barbosa a responsabilidade maciça, compacta, da derrota. O gol de Ghiggia ficou gravado na memória nacional, como um frango eterno. O brasileiro já se esqueceu da febre amarela, da vacina obrigatória, do assassinato de Pinheiro Machado. Mas o que ele não esquece nem a tiro é o chamado frango de Barbosa.” (1)

Tristeza maior, e lembro-me muito bem dessa, se deu na concentração da seleção brasileira no dia 16/09/1993, durante as eliminatórias à Copa de 1994. O Brasil faria uma partida decisiva contra o Uruguai no Maracanã, caso perdesse não iria para o Mundial. Barbosa foi visitar a delegação nacional a convite de um jornal e foi sumariamente impossibilitado de falar com os jogadores, diante do absurdo argumento de que traria azar ao grupo. O agravante: nenhum responsável pela seleção brasileira, desde o técnico Carlos Alberto Parreira ao então e atual presidente da CBF, Ricardo Teixeira, veio a público se retratar, apesar da repercussão negativa do episódio à época (2). 43 anos depois e já com 72 anos, o goleiro ainda era estigmatizado pela derrota de 50. O azar sendo invocado para esconder o preconceito racial.

Barbosa foi quem mais penou com a derrota de 50, porém foi acompanhado, em menor escala, também pelos negros Juvenal e Bigode, este acusado de covarde por ter sido agredido pelo uruguaio Obdulio Varella. Essa foi a famosa agressão que ninguém viu, mas que a imprensa brasileira propagou nos anos seguintes, forjando mais um estereótiopo ao jogador negro: o de que era covarde.


Por isso, a razão deste texto, para demonstrar o quanto o preconceito racial brasileiro é perverso, capaz de condenar um grande goleiro por toda a sua vida apesar dos vários títulos que ganhou, tanto pela seleção brasileira (Copa América - 1949, Taça Rio Branco - 1950 e Torneio de Santiago do Chile - 1953), quanto pelo campeoníssimo Expresso da Vitória, o Vasco da Gama dos anos 1940/1950 (Campeonato Carioca de 1945, 1947, 1949, 1950, 1952 e 1958; Torneio Quadrangular do Rio: 1953; Torneio Rio - São Paulo: 1958; e Sul-Americano de Clubes: 1948). Vestiu a camisa do Brasil em 22 jogos, alcançando 16 vitórias, 2 empates e 4 derrotas. Defendeu as camisas do pernambucano Santa Cruz, e dos cariocas Bonsucesso e Campo Grande, clube no qual encerrou a carreira em 1960. (3)

Ao senhor Moacir Barbosa do Nascimento, onde quer que esteja realizando sensacionais defesas, aqui termino com carinho.

Ricardo Riso

NOTAS:
(1) RODRIGUES, Nelson. A pátria em chuteiras – novas crônicas de futebol. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. p. 69

(2) Daolio, Jocimar. A superstição no futebol brasileiro. In: Daolio, Jocimar (ORG). Futebol, cultura e sociedade. XXXX: Autores Associados, 2005. p. 10.

(3) MARTINS, Alexandre. Perfil de Barbosa – o goleiro do Maracanaço. Blog História do Futebol – Parte II. Em http://blog.cacellain.com.br/2009/05/29/perfil-de-barbosa-o-goleiro-do-maracanaco/ acessado em 14/06/2010.
FOTO 1 - Foto de Barbosa, site da CBF. Em < http://www.cbf.com.br/php/craques_copas.php?j=27 > acessado em 14/06/2010.FOTO 2 - Equipe titular da final da Copa de 1950. Em pé: Barbosa, Augusto, Juvenal, Bauer, Danilo Alvim e Bigode. Agachados: Johnson (massagista), Friaça, Zizinho, Ademir Menezes, Jair Rosa Pinto, Chico e Mário Américo (massagista). Foto do site da CBF. Em < http://www.cbf.com.br/php/copas.php?ano=1950 > acessado em 14/06/2010.



quarta-feira, 9 de junho de 2010

Onde estão os jornalistas negros na imprensa esportiva brasileira?

Um dado deve estar causando estranheza aos sul-africanos: não há negros na imprensa esportiva brasileira que se encontra em solo africano, pelo menos na mídia televisiva. Torço para que eu esteja errado. Se sim, corrijam-me, por favor.


Esta é apenas mais uma peculiaridade da democracia racial brasileira.

Não seria necessário começar uma campanha de cotas para negros na imprensa esportiva, ou na imprensa televisa de um modo geral?
 
Ricardo Riso